Influenciadoras investigadas por racismo prestam depoimento no Rio
As influenciadoras digitais Kérollen Cunha e Nancy Gonçalves, famosas por suas influências online, estão no centro de uma importante e necessária investigação judicial. Nesta segunda-feira, 12 de junho, elas compareceram à Delegacia de Crimes Raciais e Delitos de Intolerância (Decradi) no Rio de Janeiro para depor sobre alegações de racismo.
A Decradi também deve ouvir, hoje, o motorista de aplicativo que sofreu humilhações da dupla em 2021.
Os depoimentos de mãe e filha, inicialmente marcados para a última terça-feira (6), foram adiados devido a um pedido de remarcação da advogada de defesa. A polêmica teve início com a publicação de vídeos nas redes sociais onde as influenciadoras aparecem entregando uma banana, um macaco de pelúcia e dinheiro a duas crianças negras abordadas na rua.
O foco da investigação é um vídeo controverso, veiculado nas redes sociais das celebridades, onde entregam a crianças negras presentes de gosto duvidoso – um macaco de pelúcia, uma banana e dinheiro.
Na chegada ao Decradi para os depoimentos, as duas influenciadoras desceram do carro escoltadas pela advogada de defesa que logo avisou: “Não vai prestar declarações, dá licença”. Com ar de superioridade Nancy Gonçalves caminhou falando: “Não encostem em mim, vocês estão encostando em mim. Só falo na presença da minha advogada”.
O depoimento durou mais de quatro horas e ambas as influenciadoras optaram por não conversar com a imprensa.
A ORIGEM DA DENUNCIA
A especialista em Direito antidiscriminatório, Fayda Belo, denunciou as duas em uma rede social, classificando a atitude das influenciadoras como “racismo recreativo”. Esse termo é utilizado para caracterizar a discriminação contra pessoas negras com o propósito de divertimento.
Nos vídeos, Kérollen é vista questionando um menino negro se ele preferiria um presente ou R$ 10. Ao abrir o presente e descobrir que era uma banana, o menino expressa insatisfação e se afasta. Em outra gravação, Nancy faz uma oferta semelhante a uma menina, que parece contente com o presente recebido, um macaco de pelúcia.
RACISMO RECREATIVO E DESCULPAS ESFARRAPADAS
O escândalo ganhou repercussão nacional após a postagem de um vídeo em que a dupla oferece presentes e dinheiro a crianças negras em vias públicas. De acordo com um testemunho, as crianças estavam cientes dos presentes que receberiam. Evaldo de Jesus Farias, que participou de uma das gravações em 2021, confirmou que as crianças pediram para serem filmadas e estavam conscientes do conteúdo.
As influenciadoras, inicialmente agendadas para depor na terça-feira anterior, adiaram seu depoimento. Com mais de um milhão de seguidores no Instagram e treze milhões no TikTok, qualquer ação das influencers causa grande impacto.
Se confirmadas as acusações, as influenciadoras enfrentarão pelo menos três inquéritos, todos relacionados a racismo recreativo – uma forma de discriminação racial disfarçada de diversão. A especialista em Direito antidiscriminatório Fayda Belo foi quem denunciou o incidente, resultando na atual investigação.
HUMILHAÇÃO DE MOTORISTA DE APLICATIVO
Em um terceiro vídeo, as influenciadoras aparecem criticando o cheiro do carro e o cabelo do motorista de aplicativo. Posteriormente, elas alegam tratar-se de uma brincadeira e dão ao motorista R$ 200 como pedido de desculpas.
Os vídeos, gravados em São Gonçalo, na Região Metropolitana do Rio, foram posteriormente removidos. Em nota, as influenciadoras, que contam com mais de 1 milhão de seguidores no Instagram e 13 milhões no TikTok, alegaram que “não havia intenção de fazer qualquer referência a temáticas raciais ou a discriminações de minorias” nos vídeos.
QUEM SÃO ELAS
A despeito da representação como “mãe e filha divertindo você”, Nancy e Kérollen, em vários vídeos, se identificam como meias-irmãs de pais diferentes. Nancy chegou a narrar em um dos vídeos como assumiu a criação de Kérollen após a mãe delas ameaçar entregar a caçula para adoção. Em um adendo a seu passado, Nancy menciona que se tornou garota de programa “por necessidade” e para cuidar de Kérollen.
Os vídeos geralmente são gravados em Niterói e São Gonçalo, na Região Metropolitana do Rio, embora a localização exata dos registros seja desconhecida. Kérollen e Nancy postam de dois a três vídeos curtos por semana no Instagram e TikTok, variando entre pseudo ações de caridade, testes de produtos de beleza e pegadinhas.
Em vários clipes, a dupla aborda pessoas na rua oferecendo dinheiro ou um “presente misterioso”, dando origem aos vídeos contestados com a banana e o macaco de pelúcia. Outro vídeo polêmico apresenta a dupla oferecendo uma linguiça a um homem faminto, vendando seus olhos e colocando larvas vivas em sua boca.
Em alguns momentos, seguidores questionam a autenticidade das cenas, como quando um homem descalço bate no portão das influenciadoras pedindo socorro com um bebê no colo. O rosto dele é cortado, mas a câmera mostra a criança, que muitos sugerem ser uma boneca. O clipe termina com a dupla alegando entregar R$ 2 mil em dinheiro ao homem.